terça-feira, 26 de julho de 2011

Essa noite sonhei que estava no céu, não tinha morrido!
Apenas fui passear e conhecer o lugar onde todas nós mulheres vamos estar um dia.
Por isso resolvi decorar tudo com azul, não importa o tom, o que importa que é uma linda cor e que traz paz.
Vamos decorar!


Hoje deixo aqui alguns lindos textos de um Autor que conhece alma feminina como ninguém.
Autor: Ryoki Inoue

Nem sempre são tapas


Morávamos, por essa época, em Gonçalves, uma pequena cidade pseudo-turística no sul de Minas Gerais. Digo, sem nenhum pejo, “pseudo-turística”, pois esse município, brindado pela Natureza com o clima do alto da Serra da Mantiqueira (a altitude média de lá é de 1.400 m), com muitos rios e riachos, com cachoeiras belíssimas e com paisagens deslumbrantes, jamais se preocupou em explorar o turismo, mas sim com explorar os turistas que, desavisados, vão para lá passar fins-de-semana, feriados e até mesmo as férias de inverno. Tudo fica estupidamente caro, tudo é complicado e difícil, tudo é explorativo. Nada é mais real do que aquele anúncio na televisão de um matuto que surge do nada com a maquininha de cartão de crédito para cobrar as goiabas que um desavisado da cidade comeu junto à goiabeira... Está certo que tudo deve ter seu preço, mas vamos e venhamos... Nem tanto o Céu e nem tanto a Terra. Em Gonçalves chegamos ao cúmulo de eu ter de mandar a empregada comprar a carne, pois se eu entrasse no açougue, o preço do filé (eu era o único a comprar filé) subia automaticamente 50%. Afinal, no conceito deles, escritor é rico, pode pagar. E isso quando não dizem que escritor não trabalha, fica o dia inteiro só escrevendo e inventando histórias.

Mas estas lamentações têm de ser deixadas de lado, para um outro artigo mais específico. No momento, tento atender um pedido que me foi feito para escrever alguma coisa sobre a violência que é praticada contra a mulher.

Pois foi lá, em Gonçalves, que minha esposa e eu viemos a tomar conhecimento de um tipo de violência que, possivelmente, é o pior de todos.

É claro que já tínhamos percebido esse tipo de estupro – afinal, com mais de 60 invernos nas costas, não somos mais tão ingênuos assim – mas foi a primeira vez que vivenciamos de perto principalmente as suas terríveis consequências.

Surgiu por lá uma senhora vinda de São José dos Campos, uma dessas “peruas” da sociedade joseense, cheia de boas intenções. Estava mais do que evidente que, por detrás dessas boas intenções, havia uma enorme dose de ambição, a perspectiva do ganho material e social fácil, à custa das mulheres autóctones.

Ela tinha como projeto criar um grupo de “patch-work” que não apenas produzisse os trabalhos, mas que, também, os vendesse e até exportasse.

Segundo essa senhora, as mulheres do local só conseguiriam produzir com eficiência, se elas de fato mergulhassem no trabalho e dedicassem tempo e coração a ele. Para tanto, era fundamental que elas se sentissem livres de tabus, de preconceitos e até mesmo de conceitos que lhe tinham sido implantados e impostos desde a infância.

Visando alcançar esse objetivo, essa dedicada senhora trouxe, além as técnica em “patch-work”, uma psicóloga para conversar com as mulheres locais e fazê-las “abrirem-se para o mundo novo” que se descortinava diante delas.

Minha esposa foi assistir a algumas dessas sessões de “psicologia aplicada” e, depois disso, comentou comigo o que tinha visto. Comentou impressionada e chocada.

Em primeiro lugar, houve muita dificuldade em convencer as mulheres a participar.

Segundo, descobriu-se que a maioria delas não tinha tempo para “essas coisas”, uma vez que o seu dia todo era tomado por atividades inerentes à terra, ativiudade4s estas que caberiam melhor aos homens da casa, como por exemplo, ordenhar as vacas, limpar a horta, dar comida às galinhas, limpar o chiqueiro dos porcos, apanhar e cortar lenha, ver o que estava atrapalhando a chegada da água à bica... E, além disso, tinham de cuidar da casa, do almoço, do jantar, da roupa, do marido, dos filhos...

Assim, elas não podiam sacrificar, para si mesmas, uma mísera hora durante o dia.

Na verdade, muitas delas bem que quiseram e se mostraram dispostas, mas acabaram sendo impedidas, fosse por seus maridos, fosse por elas mesmas, que não se julgavam com o direito de deixar de lado – Para ao maridos – as tarefas que havia nos vinham cumprindo sem a menor queixa.

E é justamente aí que reside o problema: “sem a menos queixa”.

As mulheres da roça, especialmente as roças mais pobres, mais atrasadas, são criadas desde a infância para tolerarem as situações mais injustas, sem queixas, sem reclamações. É aí que está a violência: elas são privadas desde sempre de sua liberdade de expressão, de sua possibilidade de reivindicação, de sua possibilidade de serem felizes. Sentem a obrigação de parir filhos machos – estes ajudam no trabalho braçal, mais do que as fêmeas – e deixam de lado seus sonhos e suas ambições em prol das ambições do marido que, na maior parte das vezes, nem sonhos têm e, enquanto eles estão tomando cachaça no bar e jogando truco, elas estão em suas casas, trabalhando, trabalhando, trabalhando... Sempre esperando por seu homem que, ao chegar, embriagado na maioria das vezes, ainda a tratam mal e vão para a cama suarentos e sujos, ordenando sumariamente: “vamos ver.... abra as pernas!”

Daquela dezena de senhoras que se dispuseram a participar das sessões de “psicologia aplicada” em Gonçalves, apenas duas ou três permaneceram. Estas acabaram por realizar belos trabalhos de “patch-work” que, se não lhes trouxe lucro financeiro, trouxe-o para a “perua” organizadora do grupo. Porém, estas mulheres ganharam, sim, alguma coisa: ganharam a consciência de que são capazes, de que podem realizar algo por conta própria e que não precisam se escravizar aos ditames de uma sociedade que as mantém cativas.

Hoje, pensando com um pouco mais de atenção sobre tudo isso, não sinto a menor dificuldade em transportar o problema para a nossa sociedade urbana. Ou seja, não é apenas na roça que essa violência acontece, mas ela também ocorre nas cidades, sejam grandes, médias ou pequenas. Até mesmo aqui em casa... para desespero meu.

Preso que estou a uma cadeira de rodas graças a uma neuropatia diabética, é minha esposa que arca com tudo. Desde a faxina da casa, passando pela compra e preparo da alimentação – e a minha tem de ser dieta especial – até os cuidados para comigo – e eu, velho e doente, vejo-me muito mais exigente do quer antes, até mesmo dando-me o direito de agir assim.

E ela ainda tem de achar tempo para escrever seus livros infantis e de culinária e para continuar com seu artesanato. Até poucos dias atrás, tinha também a neta, que ela criava desde o nascimento e que o pai decidiu assumir agora. Não era à toa que, O chegar à cama, à noite, minha pobre esposa estava exausta.

É bem verdade que, apesar de não demonstrar muito claramente, sou grato a toda essa dedicação e, na medida do que posso, tento aliviar a carga que, involuntariamente, deposito nas costas da Nicole.

Porém, quantos outros maridos são diferentes de mim? Quantos deles não acham que [é apenas obrigação da mulher comportar-se assim, como uma moura escrava? Que existe apenas para servir ao home, na casa, na mesa e na cama?

E surge a pergunta: não será esta violência bem pior do que os tapas levam à cadeia a quem os dá?

Quem vai à Delegacia da Mulher para se queixar que está sendo escravizada desde o nascimento e que, finalmente, está disposta a se rebelar contra esse estado de coisas?


Tragédia anunciada



Até a própria família não se surpreendeu. Os pais de Amy Winehouse disseram claramente que esperavam a morte precoce de sua filha por causa de seu envolvimento com drogas e álcool. Creio que todos os seus fãs também, no mínimo, pressentiam que ela não acabaria bem. E agora, numa homenagem descabida, junto com flores, velas e cartazes, eles estão deixando bebidas alcoólicas para ela, num peigi montado diante de sua casa.

Ou seja, eles simplesmente estão afirmando que aceitavam seu comportamento esdrúxulo e desregrado.

Com essa atitude, os fãs da cantora estão mostrando o extremo egoísmo do ser humano. O bicho-homem quer ver, assistir, ouvir, conhecer os dramas das celebridades. Quer assunto para comentar, principalmente quando o comportamento da celebridade em questão é polêmico e/ou estranho, descabido. Os fãs se regozijam quando a pessoa em destaque na mídia dá uma escorregadela. E entra em êxtase quando ela cai.


Porém, ninguém toma nenhuma atitude para tentar salvar aquele outro ser humano que, por algum motivo, está sob as luzes dos holofotes. Ninguém quer, realmente, saber as razões que levam essa pessoa a desenvolver tal ou qual comportamento, ninguém se preocupa com o motivo – ou os motivos – que a levaram a apelar para as drogas, a buscar o mundo da fantasia em troca de uma realidade que, com certeza, ela não estava conseguindo suportar.

São incontáveis os exemplo... Tantos astros talentosos degringolaram e terminaram seus dias vítimas de overdoses, acabaram por cometer suicídio, às vezes de forma ainda mais violenta...

Depois da tragédia, choro e velas. Antes de acontecer, nada foi feito. Talvez – e insisto, talvez – os pais de Amy tenham tentado lutar. Porém, no meu entender, foi uma luta um tanto débil, pois parecia ser muito mais importante que ela permanecesse nos palcos e sob os holofotes, do que estar efetivamente trancada e segura numa clínica de recuperação. Nem que fosse preciso amarrá-la ao leito, pois se a família já estava esperando a tragédia, bem poderia ter tomado providências mais drásticas para impedir esse desfecho.

Amy Winehouse não agüentou este mundo, não conseguiu administrar o próprio universo.

Mais um talento perdido para as drogas, sejam elas quais sejam.

Na mesa de estudos estratégicos dessa guerra, mais uma baixa. Mais uma batalha perdida.

Esta aparece em todos os jornais. Foi uma celebridade que morreu. Mas quantos jovens anônimos não morrem precocemente pelo mesmo motivo e ninguém fica sabendo?

A droga é, sem a menor sombra de dúvida, o câncer da sociedade. Um câncer que está eliminando nossos filhos, nossos amigos, nossos ídolos. Um câncer que precisa ser extirpado.

Essa guerra é nossa, não apenas do governo. É em casa que temos de travar a maior batalha. Conversando, exigindo, proibindo, cuidando... Até mesmo tomando atitudes drásticas.

As pessoas gozam, até biblicamente, do direito ao livre arbítrio. Cada um faz suas escolhas. Mas temos de ter a consciência tranquila e temos de poder dizer: “Fiz tudo o que podia. Ele é que não quis...”

E temos de lembrar que a overdose, nem sempre, foi algo desejado pelo viciado. Pode ter sido – e na maioria das vezes é – um simples acidente de percurso.

Um comentário: